Suyane Ynaya, uma força inspiradora na cultura brasileira, é editora de moda na Elle Brasil. Nascida na periferia de São Paulo, ela superou desafios significativos para se tornar uma voz influente no mercado editorial e um ícone para mulheres negras e mães. Suyane é conhecida por sua habilidade de criar narrativas visuais impactantes com recursos limitados, promovendo a valorização do olhar individual e da coragem. Sua trajetória, da zona leste de São Paulo aos cenários da moda global, é um testemunho de resiliência, representatividade e da crença no potencial ilimitado da periferia.
Quais são as suas maiores influências?
As mulheres da minha vida: minha mãe e minha irmã, porque elas conseguem, como ninguém, me trazer para a realidade. Já as referências de moda são o Ib Kamara, Martine Rose, Hisan e Batalha (da Dendezeiro) e Wales Bonner.
Explica para nós o que é “sevirologia“.
É a forma de se organizar com o possível. O que você tem em mãos no momento é o que irá te impulsionar para fazer acontecer.
Isso desempenhou um papel importante na sua trajetória. Como você acredita que o conceito pode inspirar outras pessoas na periferia a buscar seus sonhos, mesmo quando enfrentam desafios?
Muitas vezes, me vi não sabendo como executar o que faço hoje, que já é completamente diferente de antes. Mas, quando peguei tudo o que tinha em mãos para fazer acontecer, percebi que ali eu conseguia criar o que eu amo, com o meu olhar, e que esse olhar era fora do eixo do esperado. Foi então que eu aprendi a desenvolver com o que tenho hoje. Acredito que esta é a porta para entender o que te inspira: o que você tem diariamente é o que consegue te inspirar para algo.
Você é mãe de três filhos, como equilibrar as responsabilidades familiares e profissionais? Qual conselho daria a outras mães que buscam carreiras bem-sucedidas?
Eu gostaria muito de saber sobre equilíbrio. Penso que executo da forma como a minha mãe fez comigo: uma mulher que trabalha com mais de uma função e que ensina seus filhos sobre como devem criar suas responsabilidades juntos – eu não estarei aqui para sempre. Foi assim com a minha avó, com a minha mãe – histórias de mulheres pretas não mudam, só alguns pontos do contexto. Meu único conselho é que nós, mães, precisamos nos cuidar mais, e sei que esse tempo muitas vezes nem existe. Mas é sobre criar um mínimo de possibilidade para si, um exercício possível, um cuidado estético seu, um beijo na boca sem compromisso ou um dia só seu, se possível. Mães costumam esquecer de si, tudo sempre fica mais pesado para o lado de cá, e nessa hora nós nos soltamos de nós mesmas. Não se deixe. Resgate-se. A única pessoa que pode te salvar de você é você mesma. E eu sei que é muito te pedir para criar essa força que você pode nem ter agora, mas você precisará criá-la. Existe alguém aí dentro precisando disso.
Como você vê a representatividade negra na indústria da moda brasileira atualmente, e quais mudanças gostaria de ver no futuro?
Existiram muitas mudanças, não posso contestar, mas as mesmas que surgiram foram as que retrocederam. Estamos fazendo a pauta da inclusão se esvaziar: esse era o maior medo de muitas pessoas pretes. Menores contratações, menor volume de debates sobre… Se já era pouco, agora é quase impossível ver pessoas pretes em grandes cargos. Eu acredito que a pauta está sendo deixada de lado no Brasil. Muitos entenderam que existe um poder intelectual no nosso povo e isso traz medo de perder cadeiras. Quem manda, de fato, na indústria da moda ou na publicidade? É prete ou indígena? Então…
A periferia está ganhando destaque na moda. Como essa influência molda as tendências e o comportamento dos consumidores?
Eu acredito que a periferia sempre criou cultura e comportamento, e isso se engloba ao que a moda é e impacta diretamente quem consome. Penso que poderiam entender melhor o quanto esses códigos são ditados por pessoas que não conseguem consumir o que absorvem. Existe um impacto positivo sobre o quanto a periferia ganha notoriedade, porém, o lado negativo é que não existe alcance. Muitas marcas absorvem as culturas periféricas e não colocam as mesmas pessoas nessa notoriedade. Num geral, enxergo de forma positiva, porque a periferia anda procurando, cada dia mais, saber sobre a própria cultura. Nesse momento, eles conseguem reivindicar a sua reparação de forma justa.
Recentemente você lançou uma coleção de óculos com a Zerezes. Qual foi a inspiração por trás dessa collab? Como essa coleção celebra a ancestralidade e o Afrofuturismo?
Essa coleção partiu da história da cor azul, que a Igi Ayedun fala, que a Solange já mostrou e que o Ib Kamara apresentou na sua coleção Spring 2023 para a Off-White. Me inspirei em Nut e como a comunidade preta egípcia criou possibilidades existentes para o que podemos ter hoje em dia. No português escuro, eles criaram muitas coisas. A história de Nut engloba também a maternidade e um cuidado feminino que nos negam como provedoras. É ela quem cuida dos deuses que se vão, guarda seus corpos embaixo dela com a curvatura de ponte que seu corpo faz. Ela não tem raça, é azul, a cor mais importante criada por mãos pretas – e os livros insistem em dizer o contrário. Procurar saber sobre os escritos feitos por pessoas pretas é entender que um outro lado existe.
O que significa regenerar para você?
Perceber que existem pessoas lutando, à sua maneira, para a melhora e a qualidade de vida dos seus. E poder perceber que por mais lento que isso seja, é perceptível e traz mudanças.
Qual ação sustentável você ainda não conseguiu incorporar na sua vida, mas tem como meta?
Voltar a não consumir nada de origem animal. Fui vegetariana durante dois anos e é algo que quero seguir como meta – mas não agora.