Ela é curadora, pesquisadora e doutoranda em História pela PUC-SP. Tem como foco das suas investigações acadêmicas as vestimentas da diáspora africana no Brasil. Seu projeto de estudo resultou em feitos profissionais admiráveis, como conquistar o papel de curadora-adjunta de moda do Masp, entre 2021 e 2022, e ser membro da Comissão Consultiva do Museum at FIT, em Nova York. De 2023 para cá, atua como curadora-interlocutora convidada do State of Fashion Biennale em Arnhem, na Holanda.
Seus interesses também englobam arte, fotografia, religiosidades e memórias de família.
O que te movimenta a pesquisar moda?
Desde pequena, sou encantada por observar as maneiras como as pessoas se vestem e por tecidos. Na minha família, o cuidado com as roupas e com o vestir sempre foi coisa séria, e eu cresci nesse ambiente. Acho que isso me movimentou a pesquisar moda, compreender a importância do vestir para as pessoas e como as memórias pessoais e coletivas se apresentam por meio das vestimentas.
Quais foram as lições mais importantes que você aprendeu com os seus avós?
A relevância do trabalho com o vestir, o cuidado – uma roupa bem cortada e engomada –, e como esses ofícios foram fundamentais para a construção de nossa família. De uma maneira diferente, eu trabalho com moda atualmente e levo esses aprendizados comigo.
Como driblar os desafios da curadoria?
Cada vez mais tenho pensado na curadoria como uma encruzilhada. Com múltiplos caminhos a serem tomados e escolhas a serem feitas. Podemos adicionar aqui uma camada de complexidade que é: ser uma curadora negra no Brasil. Acho que consigo – nem sempre, ou melhor, com muito esforço – driblar os desafios imaginando outras histórias da moda e da arte. Com isso, escolho a direção para contar essas outras histórias, que nem sempre foram contadas. Vou por aí.
Existe alguma mudança que gostaria de ver no mundo acadêmico?
Mais professoras negras e indígenas contando as histórias de suas comunidades e tantas outras que queiram contar. Mais alunas negras como eu que possam contar com bolsas de estudos para as suas pesquisas, e um ambiente que seja mais saudável para nós.
Que conexão você enxerga entre memória, ancestralidade e indumentária?
Todas as possíveis. O vestir, as próprias roupas e a moda, muitas vezes, estão ligados a um universo mega glamouroso e que parece distante de nós. Mas as roupas, a moda e o vestir também podem estar ligados a memórias pessoais e histórias de família, por exemplo. Eu, enquanto afro-brasileira, venho de uma comunidade que possui a ancestralidade como um elemento fundamental para viver tanto o dia a dia, quanto o sagrado – que, inclusive, estão ligados. No meio de tudo isso, tem a indumentária como elemento constitutivo dessa maneira de viver a memória e a ancestralidade.
Quais são as suas maiores inspirações?
Minha mãe e as outras mulheres da minha família, as mulheres do meu terreiro de candomblé e a historiadora Beatriz Nascimento. Também amo a cantora Clementina de Jesus, e as escritoras Ana Maria Gonçalves e Octavia Butler. Todas extremamente chiques em vários os sentidos.
E quais intersecções entre moda e história você gosta de aprofundar?
Justamente as possíveis narrativas que a moda pode nos contar. São assuntos que se encontram nesse lugar de ser possível investigar um local, uma comunidade ou pessoas por meio da moda e das roupas que vestem.
Como você enxerga as ações e os investimentos (ou falta de) nas pautas sustentáveis dentro desse universo?
Acho que estamos caminhando, mas com muita andança pela frente. O Brasil tem tudo para ser um país sustentável em diversos campos, com destaque para a moda, que é uma das áreas mais poluentes. Acho que devemos, enquanto sociedade, olhar com atenção, aprender e investir nas comunidades que sempre lidam com o bem cuidar da terra de maneira magistral: os povos originários, quilombolas, ribeirinhos. Investimentos financeiros nessas comunidades e o cuidado da terra delas seria incrível.
O que podemos fazer agora para impactar positivamente o futuro?
Repensar nosso passado e fazer mudanças no nosso presente, aqui e agora.