A moda na era do Instagram: Propósito ou algoritmos?
Após décadas tendo as revistas como principal ferramenta de comunicação, a moda encontrou no Instagram uma mídia para chamar de sua. Entre todas as redes sociais que surgiram nos últimos tempos, nenhuma falou mais com essa indústria do que o IG. A adesão por parte de marcas, estilistas e outros criativos é tão grande que acabou por ocupar o lugar antes reservado às revistas e sites especializados, provocando uma mudança enorme na forma como se comunica, vende e consome moda e arte no mundo hoje. É inegável que a rede tem contribuído para uma insurreição global no que diz respeito à economia criativa.
Através do aplicativo, novos profissionais de nicho podem mostrar, comunicar e vender seu trabalho. Pense que há 10 anos seria impensável uma marca se tornar conhecida ou bem-sucedida se não tivesse uma loja física em um shopping ou bairro comercial. Os altíssimos preços de aluguel e manutenção já decidiam quem estaria ali. E com isso, excluíam, sem saber, uma fatia importante do mercado: os jovens. Como representação do futuro, é preciso estar sempre em sintonia com eles, que captam o espírito do tempo, entendem o novo e transformam tudo. E se a novidade é o maior combustível da moda, foi justamente aí que o Instagram encontrou a sua mina de ouro.
Com cerca de um bilhão de usuários mensais e mais de 80 milhões de imagens postadas diariamente, esta parece ser uma rede de infinitas conexões, mas ainda assim, ao longo de seus oito anos de vida, o aplicativo conseguiu se manter como uma plataforma legítima para criativos emergentes mostrarem seu trabalho. São eles os responsáveis por encontrar formas pioneiras de uso para uma geração hiperestimulada que não quer se afogar em um tsunami de selfies.
O Instagram oferece uma maneira descomplicada de descobrir e acessar o novo, seja ele em forma de arte, moda, fotografia, vídeo, sustentabilidade ou ativismo digital, ajudando assim a inflamar as carreiras de novos talentos. E é graças a essa geração com abordagens individuais que o app se mantém como plataforma inovadora. Assim, os feeds com conteúdo único ou experimental elevam o nível artístico do Instagram reforçando sua natureza de vanguarda e mantendo seus usuários super engajados.
Hoje, habitamos um mundo em constante transformação onde fórmulas de sucesso não são tão claras. A tecnologia introduziu ferramentas que descomplicam o negócio da moda para a nova geração, abrindo espaço para ideias frescas, moldadas por um ponto de vista autêntico em um mundo onde a barreira entre digital e físico, real e artificial, já foi derrubada. Essa turma altamente engajada e atenta compra pelo stories e acessa quem quiser através de uma rápida DM. Segundo o próprio Instagram, 75% dos usuários fazem uma ação, como entrar no link da bio ou efetuar uma compra após ver um anúncio – são mais de dois milhões de anunciantes hoje (e 15 milhões de empresas cadastradas), de marcas de sabonete artesanal e sapatos veganos a galerias de arte e grandes grifes de luxo.
E é no ambiente digital que todos encontraram seu abrigo natural; um lugar de infinitas possibilidades e encontros, sem barreiras sociais ou geográficas.
O que te representa? Como você enxerga o mundo? Qual o seu futuro desejável? As marcas que nascem hoje já vêm com essas respostas embutidas e atuam nas quatro dimensões – cultural, social, ambiental e econômica – impactando primeiramente a sua própria comunidade para então explorar novos mundos. Em des les de marcas como Cotton Project, Korshi 01, Cacete Company, Piet e Lucas Leão, vimos coleções e apresentações construídas não apenas por um estilista, mas por um grupo de amigos multitask e com talentos complementares que compartilham de uma mesma visão de mundo. Qualquer falta de estrutura é compensada por convicção e posicionamento. “Procuramos trabalhar com pessoas que já conhecem e se identificam com a marca. Só esse interesse em comum já é um grande passo para uma parceria dar certo”, diz Pedro Korshi.
O mais interessante é que, muitas vezes, esse posicionamento ignora o número quantitativo em prol do qualitativo. A complexidade dos algoritmos nas redes sociais torna sua usabilidade imprevisível, fazendo com que muitas marcas corram atrás de especialistas que aumentem sua eficiência e ciência na rede. Porém, o conceito de sucesso não apenas é amplo como já não é mais o mesmo, especialmente para as gerações Millennium (com visão global e conectada) e Z (21 anos ou menos, que nasceu digital, móvel e sem saber o que é um mundo sem internet).
Em uma pesquisa envolvendo 16 países, o Linkedin e a consultoria YouGov mapearam o entendimento de sucesso junto à geração Z e descobriram que ter um cargo de chefia dentro de uma empresa não é mais uma definição do que é ser bem-sucedido. Respostas relacionadas a dinheiro tiveram baixo percentual: “ganhar um aumento de salário” ficou com 21% e “ganhar mais dinheiro que meus amigos”, com 7% - por aqui, 60% dos brasileiros da geração Z já considera-se bem-sucedido.
A londrina Elizabeth Farrell a.k.a @glacier996girl é um exemplo desse pensamento: inspirada por uma aula sobre as geleiras, ela abriu o perfil no Instagram como parte de um trabalho escolar em 2015. Hoje, com apenas 21 anos, Liz é uma ativista ambiental referência e que fala sobre aquecimento global de uma maneira que seus colegas consigam entender e se interessar.
É também por esse caminho mais orgânico que segue a marca brasileira Cotton Project, buscando um objetivo maior do que uma fórmula de engajamento. “Nesse caso, digo que somos passivos, gostamos de fazer nossas coisas e quem se interessar, pode nos procurar”, diz Rafael Varandas, fundador da marca. “Parece que ficamos obrigados a tomar ações mais ativas com o público para driblar um algoritmo não amigável. Isso nos incomoda um pouco, não gostamos de imaginar nosso conteúdo como algo estudado para manipular o público. O que temos a oferecer é a qualidade do conteúdo postado”.
O mercado precisa acompanhar essa dinâmica e se preparar não apenas para o contemporâneo, mas para o que ainda está por vir. Hoje existem cada vez mais assessorias de imprensa focadas em marcas novas, multimarcas em busca de frescor, lojas que divulgam o trabalho de estilistas em início de carreira e veículos que compreendem esses códigos. São eles que nos guiarão pelo futuro.
Uma vez absorvido pelo mainstream, esse movimento vira outra coisa, atinge outro público e segue seu fluxo de evolução. Ao mesmo tempo, na raiz, ainda distante do conhecimento da massa, novos movimentos estão florescendo e seu impacto no mundo é só uma questão de tempo.